O Câncer de mama no Brasil representa um dos maiores desafios de saúde pública

Precisamos falar sobre o Câncer de Mama
Como profissional da área de saúde observo cotidianamente o impacto devastador do diagnóstico do câncer de mama na vida das mulheres e suas famílias. A doença mexe com vários aspectos da vida, além de seu impacto físico e clínico, tem profundas implicações estéticas e psicológicas nas mulheres acometidas. A mama, enquanto símbolo de feminilidade, maternidade e sexualidade, é muitas vezes associada à identidade da mulher, gerando sentimentos de inadequação e perda do valor pessoal.
Assim, o diagnóstico e o tratamento — especialmente cirúrgico — representam uma ruptura na autoimagem, no corpo e na vida emocional da paciente. As reações ao diagnóstico geralmente envolvem medo, choque e insegurança. A incerteza em relação à cura, o temor da morte e a possibilidade de recorrência provocam altos níveis de ansiedade. Muitas mulheres enfrentam quadros de depressão, angústia e perda de autoestima, especialmente quando o tratamento implica modificações significativas na imagem corporal, como a mastectomia ou a queda de cabelo. O câncer de mama pode abalar profundamente a identidade feminina, gerando sentimentos de inadequação ou perda de valor pessoal
No Brasil a patologia representa um dos maiores desafios de saúde pública sendo a segunda neoplasia de maior incidência entre as mulheres brasileiras, atrás apenas dos cânceres de pele e a primeira causa de morte por câncer em mulheres no país, em 2023 representou 20 mil óbitos, números alarmantes quando comparamos com países com maior acesso ao diagnóstico e tratamentos precoces. Merece destaque o fenômeno do “rejuvenescimento” do câncer de mama no Brasil, entre 2015 e 2022, a faixa etária de 30 a 49 representou 30,5% dos novos casos da doença, sendo que 1 em cada seis mortes ocorreu em mulheres com menos de 50 anos. Mulheres negras e pardas apresentam 44% dos diagnósticos tardios, comparando a 36% em mulheres brancas. Estes números nos alertam para a importância da realização de exames diagnósticos e ações de prevenção em mulheres destas faixas etárias.
De acordo com o Instituto nacional de Câncer (INCA), o Brasil deve registrar um aumento de 10% no número de casos de câncer de mama em 2025, registrando um total de 73.610 casos novos no período.
Quando analisamos estes dados, considerando características raciais e socioeconômicos das mulheres acometidas, fica claro as profundas iniquidades entre mulheres mais vulneráveis socialmente. Entre 2010 e 2024, observou-se aumento das taxas de mortalidade em todos os grupos raciais, sendo particularmente alarmante crescimento entre mulheres indígenas ( de 11 em 2010 e 2,1 em 2010 para 5,6 em 2024) e pardas (11 em 2010 para 15,8 em 2024, a taxa de mortalidade em mulheres pretas e pardas passou de 11,7 em 2010 para 15,7 em 2024, 44% destas mulheres apresentam diagnóstico tardio o que leva a este número maior de óbitos. Estas disparidades não refletem fatores biológicos, mas sim risco social, relacionados ao diagnóstico tardio, acesso a tratamento efetivos, condições de moradia, educação, rede social de apoio.
O sistema Único de Saúde (SUS) oferece várias possibilidades terapêuticas e estabelece que a paciente com neoplasia tem direito ao primeiro tratamento no máximo até 60 dias a partir do diagnóstico, mas infelizmente apesar dos avanços diferenças regionais de estrutura dos serviços ofertados, risco social, persistem importantes desafios no acesso ao tratamento oncológico, entre eles o início do tratamento, que ainda ultrapassa 158 dias tendo como consequência maior número de sequelas e mortes. Outra necessidade urgente é ampliar os serviços de diagnósticos e tratamento oncológicos que atualmente concentram-se na região Sudeste e Nordeste. O aumento da cobertura mamografia é o fator mais importante para aumentar as chances de cura, pois constitui-se no principal método de rastreamento precoce da doença, mas se mantém muito baixa ao longo dos anos, apenas 23% da população alvo realiza mamografias no Brasil, muito abaixo dos 70% preconizado pela Organização Mundial de Saúde.
Neste ano (2025), o Ministério da Saúde avançou e atualizou as diretrizes de rastreamento, garantindo acesso a mamografia pelo SUS para mulheres de 40 a 49 anos.
Para estimular as mulheres a prevenção e diagnóstico precoce do câncer de mama em 2018 foi instituído pela lei nº 13.733/ 2018 o Outubro Rosa, considerado um marco nas ações de conscientização da prevenção e da doença no Brasil, estas ações tem sido fundamentais na disseminação de informações sobre a doença. Esta iniciativa também tem um papel social importante: ele promove o diálogo sobre o autocuidado, a saúde da mulher e a quebra de tabus relacionados ao câncer. Além disso, incentiva políticas públicas e ações de apoio às mulheres em tratamento, destacando a necessidade de empatia, acolhimento e informação de qualidade.
Representa um movimento de solidariedade, informação e vida, lembrando a todos que a prevenção é o melhor caminho para vencer o câncer de mama.
Os principais fatores de risco modificáveis são a obesidade, sedentarismo, consumo de álcool, terapia de reposição hormonal prolongada em mulheres que possuem riscos biológicos, dieta rica em gorduras saturadas e tabagismo. Evidências cientificas robustas demostram o importante papel protetor na mudanças destes hábitos e principalmente da atividade física na prevenção da doença. Estima-se 30% dos casos podem ser evitados coma adoção de hábitos saudáveis e manutenção do peso corporal.
A luta contra o Câncer de mama é também uma luta por justiça social, a redução da mortalidade não será possível sem o enfrentamento direto das desigualdades estruturais e sociaisParte inferior do formulário.
Referências:
- Instituto Nacional de Câncer (INCA). Estimativa 2024: Incidência de Câncer no Brasil. Ministério da Saúde, 2024.
- Organização Mundial da Saúde (OMS). Breast Cancer: Prevention and Control. 2024.